Elder Andrade - uma voz a ser ouvida.




Conheci o Professor Dr. Elder Andrade lá em 1984, quando juntamente com outros jovens técnicos acreanos da época (Mauro Ribeiro, Raimundo Araújo, Tristão Cavalcante, Raulino e outros) frequentamos um Curso de Especialização em Planejamento Regional. Entrávamos num processo de formação de quadros para implantação de projetos de desenvolvimento rural. Desde então, embora raríssimas vezes tenhamos nos encontrado, sempre que tenho oportunidade acompanho seu pensamento e suas elaborações. Muitas vezes concordamos. Lembro de uma em que os projetos agroflorestais ao redor de Rio Branco foram comemorados como uma nova e criativa reforma agrária (basta ver os jornais da época). Em palestras e artigos refutei, contra a onda, aquela presunção. Elder foi dos poucos que me acompanhou. Seu espírito inquieto nunca se deixou capturar pelo politicamente correto ou por marés de popularidade que sabem os mais experientes são sempre passageiras.

Embora com lógica diferente, assim como eu o professor Élder Andrade é um crítico severo do modelo apresentado com facilidade a olhos ignorantes como sustentável. Sabe que por trás de tudo que se apresenta como alternativa para a Amazônia, apenas se move, sem alterar minimamente as próprias bases, o capitalismo.

Em sua entrevista recente à Eco Agência (link acima), deixa claro. "... as políticas climáticas e a economia verde não enfrentam os problemas estruturais que geram as mudanças climáticas no mundo, como, por exemplo, o atual padrão da civilização capitalista, denominado por um consumo crescente de mercadorias, que demandam mais e mais energia, e a concentração de renda que acompanha esse movimento". Concordo em parte. E explico:

Como sabem os que me lêem, não acredito que as mudanças climáticas sejam geradas pelo "padrão de consumo da civilização capitalista". O que o padrão gera é a escassez relativa ao aumento do consumo. As mudanças climáticas que, aliás, historicamente sempre existiram, só entra na conversa para dar sustentação ao discurso da administração das expectativas das nações pobres.

Sobre a economia verde, Elder assinala com exatidão. "Essas pessoas passam a ganhar dinheiro com o discurso de que conservarão o planeta, seja através de documentos diversos, como a comercialização dos créditos de carbono, serviços ambientais. Enfim, todas essas políticas que são vendidas como a salvação dos problemas climáticos." É isso ai. Faltou dizer que essa gente também ganha fama e prestígio.

Élder parece acompanhar os que questionam a ideologia do desenvolvimento. É como perguntar "que desenvolvimento"? Autores muito próximos de nós brasileiros como Ignacy Sachs já apontavam para esta questão há 30-40 anos. Quando dizia que não há um modelo pret-a-porter de desenvolvimento, Sachs  estava negando a replicação de padrões de consumo, de expctativas, de modo de vida. Infelizmente, a realidade parece estar contra ele. Não pensemos que a "primavera árabe" é apenas um grito de liberdade contra ditadores sanguinários. É sobretudo a abertura de novos mercados. Cada mulher que no Iemen queima seu véu, sonha com uma maquiagem Victoria Secret.

Em sua crítica às políticas para a Amazônia, Elder se refere, entre outras, à Lei de Concessão de Florestas Públicas. Mais que qualquer outra, esta deveria ter o nome de Lei Marina Silva, dado o esforço da então Ministra para sua aprovação. Acompanhei de perto os debates, assisti várias audiências públicas, li diversos documentos. O mantra preferido da Marina "Precisamos valorizar a floresta em pé" era música para os ouvidos das madeireiras. O capital estava, através da Lei de uma ambientalista renomada, apropriando definitivamente a Amazônia.

Segundo Elder, "Todas as famílias que vivem do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes estão cadastradas no programa Bolsa Família, apesar de praticarem o manejo comunitário de madeira há quase uma década". Quer dizer, estão situadas abaixo da linha de pobreza. Uma vergonha, seguramente, mas uma situação que não surpreende quem consegue olhar a floresta e seus atores internos e externos sem as viseiras do engajamento político-partidário.

Recomendo que leiam a entrevista e prestem atenção ao pensamento e elaboração do Professor Elder Andrade. É claro que não tenho a esperança de que sua crítica altere o andar da carruagem, principalmente porque em determinados centros de decisão o que menos se admite é voz discordante. A política tem o condão de criar ouvidos seletivos, ou seja, aqueles que só escutam aplausos e bate-paus. Mesmo assim, que sirva de alento aos que ousam pensar.

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