Marina Silva no "Roda Viva".


Entrevistas como as do excelente programa “Roda Viva” da TV Cultura dependem muito das perguntas e dos perguntadores. Já se viu muita gente boa sair dali tonto, como de uma roda viva mesmo. Outros saem rindo como de um passeio de cavalinho. Nesta segunda-feira foi a vez de Marina Silva.


COMENTO

A impressão que tive é que os perguntadores foram muito bonzinhos com a Marina. Esta, aliás, é uma de suas vantagens. É difícil ser mauzinho com ela. Em vista de sua aparência qualquer ataque tem jeito de covardia. Não tenho dúvidas de que ela teria se saído melhor se mais fustigada. Deixemos pra próxima.

Em rápida análise, vamos por pontos.

Economia: melhor que no Jô Soares. Encontrou uma saída melhor para as questões macroeconômicas. Abandonou aquela bobagem de “perguntar aos universitários” – os economistas. Desta vez disse que como tudo é um processo cumulativo, não terá que inventar coisa alguma. É tocar pra frente. Lula fez isso, né? Agora precisa saber direitinho o que significa tocar pra frente. Alguns detalhes para ilustrar a conversa.

Energia: frente à energia atômica optou por dizer que não temos essa necessidade. Faltou ênfase. Poderia dizer com firmeza que, em última instância, depois de se esgotarem alternativas menos perigosas, poderia ser empregada. Fazer o quê?

Aborto: é contra, mas não firmou posição como deveria. Propõe debate popular e plebiscito. Uma boa saída.

Partido dos trabalhadores e ética: foi esperta. Lançou mão da desculpa de que alguns erraram e, portanto, devem ser punidos na forma da lei e da democracia. Sinceramente. Falando assim parece que os caras cometeram infração de trânsito. Sabemos que foi bem mais que isso. Por que não repetiu Flávio Arns? Bom. Imagino que este talvez seja um assunto muito perigoso. A prudência recomenda muita calma nessas horas.

Senado: foi com a maioria. Pediu o afastamento do Sarney e jogou a solução pra reforma eleitoral que nunca haverá. Poderia ter aproveitado para dizer que reforma defende.

Tucanos: preservou as pontes. Fez bem. Não é hora de dinamitar coisa nenhuma. Além disso, foi justa. Marina Silva mesmo na oposição teve mais afagos no período FHC do que na era Dilma.

Candidatura: saída obvia. A rigor ninguém é candidato ainda. Por que ela seria a primeira a sair por ai se dizendo candidata e analisando pesquisas? O tiroteio tem data marcada.

Chavez: manteve coerência. Não poderia dizer como candidata o que não disse nem vai dizer como senadora. De todo modo gestos e sinais demonstraram desconforto na resposta. Sabe que os brasileiros não gostam de Chavez.

Presença do estado na economia: a crise deu o tom. Evidenciou a necessidade do Estado na regulamentação e controle. De todo modo, não caiu na cilada de revivificar ideologias estatizantes.

Maconha: nesta, não titubeou, nem pediu plebiscito. É contra e pronto. Candidato a favor vai se ferrar. No Brasil, nem traficante é a favor da liberação. Só usuários e FHC.

Arrisco dizer que o melhor momento da Senadora é mesmo quando ela ensaia uma interpretação nova da vida, da economia, do consumo, do bem-estar, da felicidade, do futuro. Isto é o novo para o eleitorado de modo geral. Linkar a questão ambiental ao dia a dia das pessoas sem romper com suas expectativas é, talvez, a pedra de toque de seu melhor discurso.

Se Marina Silva conseguir capturar psicologicamente o eleitor na perspectiva de que a humanidade está vivendo um momento crucial e que níveis elevados de bem-estar somente serão sustentáveis a partir do desuso de padrões deletérios e da adoção de novas e renováveis fontes de energia e, mais, que isso não é impossível de se realizar, talvez possa de fato “contaminar” o imaginário popular com uma nova utopia.

O discurso reto e pragmático que muito provavelmente terão seus opositores, embora correto e eficiente, convenhamos, é velho e conhecido. Seus adversários são demasiadamente cartesianos para emocionarem o eleitorado. O discurso do choque de gestão ou da gerência de resultados convence, mas não encanta. Marina pode, então, se tornar uma verdadeira pedra no caminho de quem não tem poesia.

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